Jornalismo e inteligência artificial
O mercado de trabalho está mudando. Só não vê quem não quer. E quem não se reciclar vai ficar para trás. Algumas profissões estão com os dias contados, como é o caso de cobrador de ônibus, carteiro, atendente de telemarketing, agente de viagem, corretor de imóveis. E vai mudar ainda mais por causa de inteligência artificial.
No início de abril, um dos temas do International Symposium on Online Journalism foi o impacto da inteligência artificial no jornalismo, como explica o GoAd Media. Nick Diakopoulos, professor da Northwestern University, apresentou dados segundo os quais apenas “9% do trabalho de um editor e 15% do trabalho de um repórter podem ser automatizados”, usando a inteligência artificial disponível atualmente.
Várias ferramentas já vêm sendo usadas pelas redações, de acordo com a matéria, para checagem de fatos, como é o caso da Squash, desenvolvida pela Duke University, e a Chequebot, desenvolvida pelo Chequeado. Para orientar os brasileiros a checar a veracidade de uma notícia, a organização Aos Fatos usa o robô Fatima para se comunicar via Facebook Messenger.
Agora vem o que interessa aos jornalistas: se serão ou não substituídos por robôs. É bom saber, ainda segundo o GoAd Media, que, hoje, boa parte das notícias são produzidas por eles, como ocorre na Bloomberg e na Associated Press – “textos rotineiros sobre relatórios financeiros divulgados pelas empresas de capital aberto”. Com isso, os jornalistas ficam liberados para produzir reportagens mais complexas.
A AP também usa uma ferramenta para “ajudar a identificar, mais rapidamente, potenciais notícias em meio ao gigantesco volume de informações compartilhadas nas redes sociais”.
Uma matéria da Agence France Presse, reproduzida pelo Estado de Minas, também em abril, revela uma curiosidade: em novembro do ano passado, um bot chamado Tobi “produziu quase 40 mil artigos sobre os resultados das eleições na Suiça para a Tamedia, em apenas cinco minutos”. Segundo a notícia, “ele escreveu sobre os resultados de cada um dos 2.222 municípios suíços, em francês e alemão”.
Outros veículos, segundo a AFP, também lançaram mão da inteligência artificial, como é o caso do The Washington Post, a agência de notícias norueguesa NTB, o Los Angeles Times e o Le Monde.
E no Brasil? Em março do ano passado, foi publicada, no blog Jornalismo nas Américas (Knight Center for Jornalism in the Americas, da University of Texas at Austin), uma pesquisa conduzida por Lucas Vieira de Araujo, professor da Universidade Estadual de Londrina, para entender “O que pensam as maiores empresas de comunicação do Brasil, de âmbito nacional e regional, sobre algoritmos, inteligência artificial e linguagem NLG e quais as perspectivas dessas tecnologias no país? O estudo incluiu, segundo o professor, os Grupos Globo, Folha, Estado, Abri, Record, RBS, Ric, SBT e Emissoras Pioneiras.
Entre outros, os resultados foram os seguintes:
- Os gestores das empresas brasileiras de comunicação entrevistados mostraram-se, de forma geral, céticos e descrentes com os algoritmos. Apesar de considerarem a tecnologia promissora, não veem no curto prazo uma integração maior com ela.
- Eles estão preocupados com o custo da tecnologia em relação aos benefícios gerados para redução de gastos
- Os entrevistados citaram como impedimento questões legais e normativas – lembrando que o uso de algoritmos representa mudança nas atribuições dos jornalistas e na estrutura de cargos das redações.
- Ainda não estão internalizados os mecanismos de integração entre humanos e máquinas para a produção de notícias.
- Foi unânime a percepção de que estas tecnologias prejudicam a sociedade por meio da produção e disseminação de notícias falsas
- Outra concordância geral foi quanto à inexorabilidade do jornalismo algoritmo.
As conclusões a que se pode chegar diante disso tudo e do que várias empresas já estão fazendo é que a inteligência artificial é – ou será muito em breve – uma realidade no jornalismo. Não tem volta. Vai acontecer. A questão que preocupa – e não só aos jornalistas – é se os robôs vão provocar (mais) demissões e o nível de confiabilidade do que é produzido. E, numa visão futurista (e catastrófica), se os robôs vão dominar tudo, inclusive os seres humanos. Conheço várias pessoas que acreditam piamente nessa possibilidade.