Reclamar para quê?, por Beth Guaraldo
Reclamar é uma atitude inerente ao ser humano. Reclamamos do tempo, do trabalho, da comida, do calor, do frio, da dor, de saudade, das pessoas …. Conviver com a reclamação é insuportável. Cansa. Esgota a energia dos outros. Mas, acredito que encontrei um antidoto para a reclamação. E esse remédio é fazer o ‘reclamão’ perceber que ele não tem motivos par isso.
Descobri isso recentemente. Tenho estado no ICEP – Instituto do Câncer do Estado de São Paulo para visitar uma pessoa que passou por cirurgias. Todos que estão internados lá – na UTI, nos leitos ou no pronto socorro – sofrem de câncer, dos mais simples e fáceis de curar aos mais letais e terminais.
Basta ficar, como eu já fiquei, alguns momentos sentado do lado de fora para notar o entra e sai de pacientes em vários estágios da doença. Vi muitas mulheres usando lenços na cabeça para encobrir a falta de cabelos, pessoas em cadeiras de rodas, muletas, apoiando-se em parentes, com fisionomias cheias de dor. Mas, o que não falta a nenhuma delas é esperança.
O ICEP só atende pessoas encaminhadas pela rede estadual de saúde, o que equivale dizer que, em muitos casos, a situação financeira de alguns pacientes também é bem difícil. Há lá pessoas que ficam horas aguardando a ambulância ou à espera de um parente ou amigo para levá-las para casa. O dinheiro de que dispõem não permite outra alternativa.
Na hora de ir visitar um paciente, recebemos muitas outras lições. Na fila ou dentro do elevador, escutamos as histórias mais tristes, as mais inspiradoras, as mais emocionantes e de aceitação. Outro dia, indo ao 18º andar, ouvi uma senhora ainda jovem contando a doença do marido. Ele teve câncer no rim. Depois da cirurgia, fez os tratamentos recomendados e ficou bem durante três anos. Recentemente, durante um exame, descobriu um tumor no pulmão. Agora, foi para o cérebro. Está internado na UTI em estado terminal.
Vi também um senhor de 95 anos que tinha um câncer no rosto. Passou por uma cirurgia extremamente complexa, foi para o quarto e esperava a alta hospitalar para o dia seguinte. Sorridente, gostava de conversar.
Sempre que saio de lá, percebo o tamanho da minha sorte, por ter saúde, por não ter de viver o que muitas pessoas que passam por lá são obrigadas a enfrentar: a doença, a dor, a falta de recursos materiais, a desesperança. Eu não posso reclamar da vida. A maioria das pessoas não pode reclamar da vida.
E se pensarmos bem, reclamar para quê? O que a reclamação resolve? Nada, certamente. Então, se você conhece uma pessoa que vive reclamando leve-a até um hospital de doenças graves como o Instituto do Câncer. Garanto que ela vai perceber que não tem razão alguma para reclamar da vida. Porque, pela minha experiência, quem tem razão para se queixar não faz isso.