A luta para não se tornar obsoleto diante das inovações, por Eduardo Marini

É inegável: automação tecnológica, internet e inovação aprimoram o cotidiano. Beneficiados por elas, vivemos mais tempo, adoecemos menos, comemos melhor, cuidamos da saúde com recursos eficazes e nos deslocamos com velocidade, conforto e segurança cada vez maiores.

Mas, fiel à regra de que nada na história da Humanidade é apenas benefício, essas boas novas geram também “efeitos colaterais” negativos. O mais impiedoso é o isolamento e a retirada de milhões de profissionais das atividades produtivas e do mercado a cada descoberta implantada em escala mundial.

O impacto é sentido de forma mais impiedosa em nações pobres. E também naquelas em desenvolvimento, com milhões de trabalhadores com pouco ou nenhum estudo ou qualificação formal. Pessoas que aprenderam de forma intuitiva uma única atividade – e a exerceram até o momento dela ser reduzida drasticamente reduzida ou mesmo extinta pela mudança de paradigma promovida por mais uma inovação tecnológica. O segundo exemplo remete a alguma nação conhecida? Pois é: no Brasil, a falta de qualificação e educação formal tira de milhões de trabalhadores a capacidade e o ímpeto de se reinventarem.

Um legítimo drama contemporâneo, que me faz lembrar de minha mãe. Estável por décadas como telefonista da antiga Companhia Telefônica Brasileira (CTB) no Estado do Rio, virou sem-profissão com a implantação do DDD e do DDI automáticos. Com três filhos pequenos, que muitas vezes levava à sala de aula, por não ter com quem deixá-los, voltou à escola para diplomar e passar em dois concursos para professor estadual, em quarto lugar no primeiro e em décimo-segundo no outro. Exemplo de resiliência que, infelizmente, muitas vezes não gera final feliz entre os brasileiros batalhadores.

Teses, estudos e pesquisas radiografam o problema. Em entrevista ao jornal espanhol El País, o economista e escritor italiano Michele Boldrin, 61 anos, da Universidade de Washington St. Louis, estudioso do tema, destaca que as inovações em todo o mundo aniquilam empregos em velocidade bem maior do que a de geração de novas vagas pelos sistemas educacionais.

Diz ele: “A desigualdade é fruto natural da inovação. Como não há crescimento sem inovação, a desigualdade torna-se efeito secundário do crescimento econômico. Cada invento dá vantagem a uns e substitui uma quantidade bem maior, diminuindo a utilidade destas últimas. Iniciado o jogo, não há retorno: algo que torna minhas habilidades em inúteis está implantado”.

Relatório da Foundation of Young Australians (FYA) atesta que 60% dos jovens daquele país conquistam ou estão em busca de atividades fadadas à obsolescência e “afetadas radicalmente por ao menos dois terços de automação” entre dez e 25 anos. Estudo da consultoria PwC aponta que são grandes as chances de robôs substituírem pessoas em até um terço das profissões no Japão, Reino Unido, Alemanha e EUA até 2030.

No site https://willrobotstakemyjob.com/ (algo como Será que os robôs pegarão meu emprego), criado a partir de um estudo da Universidade de Oxford, é possível até mesmo saber o percentual de “perigo de automatização” da cada profissão nos próximos anos.

E a saída? A resposta vale bilhões ou talvez trilhões de dólares. Mas algumas decisões têm potencial de amenizar o problema. Ou de, no mínimo, reduzir as chances de sucesso da Lei de Murphy no caso. A elas:

*Abertura às mudanças – Se você é um profissional maduro, com tempo de trabalho pela frente, e o antigo sonho de fazer mais ou menos a mesma coisa mais ou menos do mesmo jeito do início ao final da carreira, tente mudar a cabeça. “Aprenda” a gostar de variações que sua profissão pode oferecer. Só assim você encontrará ânimo para buscar reposicionamento. Entre jovens, é imperioso pensar assim desde a formação.

*Áreas “consagradas” – Para enfrentar as mudanças em ritmo estonteante promovidas pelas inovações tecnológicas, especialistas aconselham escolher, sempre que possível, áreas “consagradas” como Direito, Medicina, Engenharia, Letras e outras relacionadas à formação e pesquisa. E cursos ligados à tecnologia. Essas formações oferecem base sólida na necessidade de mudança de rumo.

*Versatilidade – Aprender a aprender é uma competência defendida pelos educadores mais eficientes do mundo. É também um dos pilares da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), novo documento normativo dos ensinos infantil, fundamental e médio do País. Isso inclui a obrigação de se desenvolver, em cada aluno, sensibilidade e percepção para identificar o momento de adaptar ou redirecionar a qualificação em busca de melhores resultados.

E o resto? Coragem, autoconfiança, dedicação, insistência, coração e mente abertos. De nada adianta brigar com a realidade que se impôs e chorar por um mundo que não voltará mais.